Tente lembrar de quando você era criança, de como preenchia seu tempo, com o que se ocupava. Provavelmente, nada em específico, você ficava por ali, com seus brinquedos e seus amigos. Só que esse “nada” na verdade é uma grande preparação, um ensaio para como será a vida mais à frente. O brincar e o desenvolvimento social da criança caminham de mãos juntas. Quando a brincadeira envolve um ou mais parceiros, também a interação e a reciprocidade começam a entrar na jogada, com o uso de gestos, expressões faciais, trocas de turno (você me dá, eu te dou aquela…). O senso de identidade da criança e a sua capacidade de entender o outro (e que o outro pode querer algo diferente, p.ex) não se desenvolvem de outro jeito se não for através dessas relações, que devem ser proporcionadas e estimuladas desde cedo. O desenvolvimento social é talvez a principal consequência de brincar com o outro.
Um outro aspecto fundamental que a brincadeira desenvolve é o chamado “pensamento simbólico”, a capacidade de entender que um objeto representa uma coisa do mundo real. Usar esses símbolos permite às crianças aprender sobre o mundo real, testar suas hipóteses sobre como as coisas funcionam (“se eu colocar esse carrinho aqui, será que ele cai?”, “com eu faço para isso voar?”), ensaiar suas ações, testar seus medos em um ambiente seguro, expressar sua imaginação e, principalmente, rememorar e reviver situações do dia-a-dia, muitas vezes aplicando sobre elas diferentes versões dos fatos (“mamãe e eu saímos, eu caí e daí veio uma ambulância”).
Quando eu falo sobre brincar não estou necessariamente falando sobre brinquedos. Muitas vezes uma sala cheia de brinquedos novos e não experimentados não produz nada na criança além de uma absoluta desorganização do comportamento! Brincar, no sentido mais intencional e planejado da coisa (no sentido “terapêutico”), envolve obrigatoriamente o aspecto da interação com outra pessoa – que, sendo um adulto, estará lá para modelar (que é o termo técnico para demonstrar, representar, senão teatralizar) para a criança ações e reações frente à brincadeira, de forma que a criança possa aprender “o que fazer”, “como fazer” e “o que dizer” em diferentes situações e cenários, a partir de uma experiência prazerosa e feliz.