A dificuldade que as escolas, em sua farta maioria, revelam em promover práticas positivas de inclusão são um sinal muito revelador de como as coisas não andam bem em termos sociais. O que me espanta cada vez mais é que essa dificuldade é composta e agravada por dois lados: de um, a escola, do outro, as famílias dos alunos “regulares”, aqueles que não necessitam adaptações, acomodações ou outras formas de suporte.
No lado das escolas, existem dificuldades de flexibilização e customização, calcadas num modelo muito arcaico de ensino. A maioria parece presa à ideia de que todo mundo – todos os alunos – precisam se ajustar ao conteúdo programático, e não o contrário. É o império do conteudismo: o que importa é o currículo, não é o aluno.
Abrir-se à uma visão na qual o papel da escola é justamente identificar as características individuais dos seus alunos para que os conteúdos sejam trabalhados em forma, ritmo e profundidade diferentes com diferentes subgrupos de alunos é algo que escapa ao pensamento das escolas em geral. Até a BNCC e seus famigerados “itinerários formativos” no ensino médio estão mais alinhados com uma pedagogia moderna do que a proposta da maioria das escolas locais – que parecem insistir num modelo não-individualizado, pacotão, onde todo mundo é “tratado igual”.
Essa prática – que já é criticável nos cenários típicos, regulares –, é o embrião da dificuldade de promover os ajustes necessários à inclusão. É a obsessão com os conteúdos “previstos” que torna difícil para as escolas fazer com que a prova de João, que no 5o ano só escreve algumas frases soltas, seja uma produção textual — habilidade-chave para sua vida e um objetivo alinhado ao seu estágio atual de desenvolvimento. Mas não: no 5o ano, João fará prova sobre o pretérito perfeito do subjuntivo e a classificação dos advérbios.
O outro lado sombrio dessa história são as famílias “dos outros” alunos. As escolas referem ser questionadas e sofrer pressão por parte de alunos típicos e suas famílias sobre as “vantagens” que os alunos de inclusão recebem. No mundo dos vitimizados, o problema é que “não é justo” que João faça uma prova diferente, mais simples. Onde vamos parar?