Existe uma perigosa tendência de patologizar comportamentos normais da infância, propagada pelas redes sociais, instagram, coaches da vida e pseudo-celebridades vendedoras de cursos. É um troço horroroso, que mistura desinformação com falta de senso crítico temperada por uma mentalidade caça-níquel.
Não é que TOD não exista, mas – francamente – é quase isso. Ou pelo menos o Transtorno Opositor Desafiante real tem muito pouco a ver com o que as pessoas imaginam. Não passa uma semana sem que alguém apareça no consultório questionando se seu filho tem TOD – geralmente porque alguém (e, para meu espanto, esse “alguém” agora frequentemente é a escola) sugeriu a possibilidade.
Vamos às explicações. Primeiro, não existe base neurobiológica ou genética para TOD. Ou seja, TOD não é uma alteração específica, conhecida, do cérebro infantil. É tão somente um conjunto de sintomas: características clínicas, descrições de comportamentos observáveis que ocorrem em algo entre 1-5% das crianças. Quando esse padrão de comportamento é encontrado, dizemos que a criança tem TOD.
Que comportamentos são estes? Ainda que sim, TOD envolva desobediência, indisciplina e comportamento desafiante, provocativo, o TOD real é bem mais do que isso. É um transtorno mental. E, na psicopatologia, ele é um primo-irmão do Transtorno de Conduta (aquela criança que maltrata animais, foge de casa, coloca fogo e destrói coisas dos outros, p.ex), que por sua vez é a versão infantil do Transtorno de Personalidade Antisocial – aquele dos ladrões, criminosos, gente que rouba, furta, mata. Entende?
A criança que tem TOD de verdade ela desobedece e provoca e briga pelo prazer que isso lhe traz. É intencional, deliberado, ela não está simplesmente reagindo. A grande maioria das crianças que apresenta comportamentos opositores é simplesmente pouco equipada emocionalmente; tem baixa auto-regulação do comportamento, aprendeu padrões disfuncionais no dia-a-dia de uma indisciplina pouco contida e mal-manejada pelo seu entorno familiar e/ou escolar. Um misto de falta de limites com dificuldades emocionais, em que parte da explicação está na criança, parte no contexto – mas nada disso é transtorno.
TOD é a criança que deliberadamente faz coisas para incomodar os outros. Que é malvada, que faz coisas ruins porque quer, porque tem prazer em fazer isso. É aquela que guarda remorso e planeja vingança. Que ofende, xinga, desafia qualquer autoridade – não só pais ou professores. É o menino que desobedece o segurança do condomínio, que fura pneu do vizinho com prego, que ignora e despreza qualquer regra. Não é a criança que bate nos coleguinhas porque não sabe se comunicar bem, ou que desobedece os pais quando eles mandam ela guardar os brinquedos. Existe um mar de diferença entre as duas coisas.