Esse é um padrão conhecido: a mãe que vive em busca de “estimular” o seu filho. Ela vê nele uma criança inteligente, cheia de potencial, e se preocupa que suas capacidades não estejam sendo plenamente exploradas. Ela entende que, como mãe, tem esse papel: estimular o desenvolvimento do filho. Para que ele seja capaz de ser e fazer tudo o que quiser. E, vendo que ele dá resposta, ela se convence diariamente da importância disso. À medida que ele avança, a passos largos ou curtos, tanto faz, esse comportamento vai sendo reforçado. Dia após dia, cresce a convicção de que ele se desenvolve como fruto da sua obstinada e zelosa ação.
[Nota: Se você se reconhecer neste texto, ou reconhecer nele a mãe do seu filho ou alguém que você ama, entenda que não escrevo isto como uma crítica azeda ou insensível, mas para fazer um alerta sobre as potenciais, inadvertidas, consequências desse estilo parental. Há muito mérito em estimular, mas é preciso acertar a medida. E, sim, pode ser um pai estimulador.]
O problema desse comportamento, desse hábito, dessa mania de “estimular” a criança — que geralmente se acompanha de uma necessidade de ordenar, organizar e comandar incessantemente a vida dela — é que ele gera crianças inseguras.
Sem perceber, a mãe passa o tempo todo testando a criança. Fazendo perguntas. Esperando respostas que a criança, muitas vezes, não está pronta para dar. Crianças não sabem, p.ex., conversar como adultos; não entendem o que nós esperamos como resposta nas mais coloquiais das interlocuções, tipo “E, aí, como foi hoje na escola?”. Isso, o small talk, a conversinha de elevador, é um universo (chato) que só pertence à vida social adulta.
No afã de gerar curiosidade, ensinar, fazer conhecer e entender as coisas do mundo, a mãe termina dando um nó na cabeça da criança, que se vê obrigada a pensar e fazer coisas que só interessam a nós. As dúvidas, as curiosidades, os porquês devem vir da criança e não serem imputados, inseridos ou fabricados por nós. Quando a gente fala demais, pergunta demais, cobra demais, termina inibindo — ou mesmo sufocando — a criança.
Quando vai brincar, a mãe estimuladora quer ensinar as regras certas; não pode ser de qualquer jeito. Quer que os brinquedos sejam guardados. Que as visitas sejam cumprimentadas corretamente. Que os horários sejam cumpridos e a alimentação seja balanceada. Há muitas regras e uma preocupação exagerada com a quebra delas.
E nisso a criança se perde. Perde sua naturalidade, sua espontaneidade, sua confiança em saber fazer, saber agir, ser quem ela é. Perde a segurança de que está fazendo certo e passa a desacreditar em si ou que possa existir o seu certo. Na visão infantil, o que fica é a sensação de estar sempre em débito, sempre precisando alcançar algo, sempre estar sendo testado. Na cabeça da criança, tudo pode estar errado (preciso checar com a mãe) ou tudo sempre parece que poderia ser melhor ou deveria ser de outro jeito. Tem uma falta que fica.
O oposto disso é a criança se sentir plena. Segura. Confiante. Saber que ela pode errar. Que ninguém está contando pontos. Que a vida não é um eterno desafio, uma corrida ou uma competição. Uma criança feliz é segura de si. E só é segura de si a criança que sente que ela pode ser quem ela é. Que a família a conhece e a reconhece exatamente como ela é, admitindo as falhas, os acertos, os fracos e os fortes que todos nós temos como uma parte natural da existência humana.