Vale a pena fazer teste neuropsicológico?
Não gosto de testes. Já fui mais adepta, confesso, mas hoje olho com muita desconfiança e um pouco de desprezo para medidas que comparam um indivíduo à “média”. Medidas individuais, sim, essas são ótimas. Saber como a pessoa estava antes e como ela está agora. Ela contra ela mesma. Como está o progresso? No que ela avançou? Onde está patinando?
No universo em que eu trabalho, a comparação de uma criança em relação à média têm vários problemas, dos quais eu destaco três:
- crianças com transtorno do neurodesenvolvimento são muito diferentes entre si. Há pouca homogeneidade nesse grupo, logo, a média é pouco informativa.
- usar uma escala (uma régua) de crianças típicas para medir crianças atípicas é, na maioria dos casos, um tapa na cara da criança e da família.
- se é necessário um teste para identificar pontos fortes e fracos da criança, é porque estas características não são, de fato, tão fortes ou tão fracas assim.
Ouvi de um renomado neurologista de adultos, que trabalha com demências (vejam só! com memória!) que teste neuropsicológico é old school. Coisa antiga, não se usa mais. Na neuropediatria parece que ainda não viramos essa página, infelizmente.
As pessoas dizem que vão pedir teste neuropsicológico para traçar “as habilidades e as dificuldades” da criança. Ver se o problema é a velocidade de processamento da informação, a memória de trabalho, ou a atenção – ou tudo isso um pouco. Ora, se esses problemas não ficam aparentes numa avaliação clínica bem feita, de duas uma: ou o profissional não sabe ver ou o problema não existe. Precisar de um teste, de um número, um escore, para saber como ou o que trabalhar com uma criança é, quase sempre, enrolação ou insegurança. Você só vai encontrar algo se souber o que está procurando.
Há quem diga que esses testes representam “medidas objetivas” ou trazem “escores padronizados”, tornando a avaliação mais precisa, mais completa ou bem-feita. Nem sempre isso é verdadeiro. Primeiro, porque a aplicação do teste é diretamente dependente de fatores não-relacionados ao teste, a começar pelo avaliador. Um aplicador ruim tornará o resultado do teste inválido. O comportamento da criança e o ambiente de testagem também podem influenciar a aparente “objetividade do teste”. Não bastasse isso, muitos desses testes não foram desenvolvidos nem adaptados para o Brasil e para o português brasileiro. São traduções, com médias e pontos de corte vindos de culturas e línguas totalmente distintas.
No fim, tudo resulta numa longa jornada avaliativa, de várias e várias consultas, que custa caro, desgasta e consome tempo e energia da família e da criança e termina não mudando coisa alguma. Converse e procure entender qual a utilidade do teste antes de embarcar nessa viagem.