A imagem é forte. Me disse uma amiga: trocaram meu filho.
Tiraram a criança que eu tinha e, no lugar, deixaram alguém diferente. Neurodiverso. Atípico. Com necessidades especiais. Uma ciranda de termos bem-intencionados que buscam maquiar e absorver o impacto da avassalante e insistente ideia de “doente”. Meu filho se foi e “os especialistas” me apresentaram outra criança.
Uma criança que não é doente, não tem uma doença. Tem uma condição. Tem sintomas. Características diversas. E assim vamos. Suavizando, amparando, amainando do jeito que dá a notícia de que algo ali preocupa.
O duro dessa história é que “os especialistas” sou eu (e outros como eu). Somos nós que roubamos crianças, estrangulamos mães, esquartejamos pais, liquidamos famílias, diariamente. Mesmo com todo o samba, todo jeitinho, toda tentativa de conduzir um desenrolar suave e equilibrado, sabemos que lá no fundo fica pra família um recado que diz que tem algo errado com essa criança.
E não tem nada errado. Tem algo diferente. Algo que difere do esperado, algo que devemos estar atentos e trabalhar.
O belo dessa história, porém, é que o filho da minha amiga – muito precocemente singularizado pelos especialistas, da escola inclusive – recebeu a ajuda certa, na hora certa, e ficou bem. Ficou feliz. Ficou diferente. E, no fim, a mãe se viu com o filho trocado mais uma vez.